Boletim Especial: Patrimônio, Alteridade e Justiça: um chamado ao cuidado com as memórias invisíveis

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) sediou, nos dias 26 e 27 de novembro, o Fórum Internacional STJ de Preservação e Restauro, que reuniu pesquisadores, magistrados e representantes de instituições culturais para discutir políticas públicas e estratégias de fortalecimento dos sistemas de preservação no Brasil. Entre os destaques da programação esteve a conferência apresentada pelo Prof. Dr. Luiz Antônio Cruz Souza, Vice-diretor do CECOR da Escola de Belas Artes da UFMG, coordenador do LACICORe integrante do IIC, da ANTECIPAe do IN2PAST.

Com o tema “O Patrimônio Cultural são os Outros: Acervos Negligenciados, Cuidados e Afetos na Conservação-Restauração de Bens Culturais”, o pesquisador enfatizou uma visão ampliada do patrimônio cultural: mais do que herança material, ele é expressão das relações entre pessoas, territórios e modos de vida. Nessa perspectiva, a preservação torna-se um campo ético, comprometido com inclusão, equidade e justiça social.A abordagem de Luiz Souza chamou atenção para a necessidade de reparar invisibilidades históricas e reconhecer formas diversas de conhecimento e memória. Acervos negligenciado, arquivos científicos, coleções escolares e industriais, patrimônios de comunidades tradicionais, objetos do trabalho cotidiano, carregam narrativas essenciais sobre o país, mas frequentemente permanecem fora das políticas de cuidado e investimento.

A preservação desses bens significa também restituir dignidade aos grupos que lhes dão sentido.Outro ponto destacado foi a articulação entre ciência, tecnologia e afetona prática da conservação-restauração. O professor ressaltou que o avanço técnico, hoje apoiado em métodos como espectroscopia, imageamento multiespectral, modelagem digital e monitoramentos ambientais, só cumpre seu papel quando vinculado ao compromisso social. Conservar não é apenas intervir nos materiais, mas compreender a relevância simbólica, comunitária e histórica que eles sustentam.A discussão ganha ainda mais urgência diante de contextos legislativos que fragilizam a proteção ambiental e cultural no Brasil. Enquanto o Fórum reforçou o patrimônio como direito coletivo, medidas recentes apontam para flexibilizações no licenciamento ambiental e para a perda de garantias essenciais à preservação de ecossistemas e territórios.

O patrimônio natural e cultural, quando ameaçado, denuncia não apenas riscos ao passado, mas a ruptura de futuros possíveis.Ao concluir a conferência, o pesquisador destacou que a conservação-restauração pode ser encarada como uma forma contemporânea de justiça: patrimonial, social, epistêmica e intergeracional, garantindo que as próximas gerações possam herdar não apenas objetos, mas pertencimento, memória e referências de mundo. Cuidar do patrimônio é cuidar da vida em suas múltiplas expressões, humanas e não humanas, e é também escolher que a memória seja espaço de permanência, resistência e futuro.

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